Tariq Saleh
De Beirute para a BBC Brasil
A imprensa do mundo árabe e analistas ouvidos pela BBC Brasil ressaltaram nesta terça-feira a situação delicada que vive o Egito em meio à crise provocada pelo ataque israelense contra uma frota que levava ajuda humanitária à Faixa de Gaza.
Segundo alguns jornais, o Egito decidiu abrir a fronteira do país com Gaza para evitar que ganhasse força a tese de que o país colabora com Israel.O portal do diário egípcio Egypt News diz a decisão foi motivada por um "profundo senso de constrangimento e a pressão sentida pelo governo de que ficaria com uma imagem de colaborador de Israel em um momento extremamente delicado".
"Os críticos domésticos e no exterior já estavam retratando o Egito como um cúmplice de Israel após esta mais nova crise. A decisão do presidente (do Egito, Hosni) Mubarak foi por uma necessidade urgente - ou atendia a um curso natural de revolta árabe ou ficaria com a imagem extremamente arranhada junto às massas", completou o jornal.
'Credibilidade substituída'
Para outro diário egípcio, o Al Masry al Youm, o Egito teve seu papel de mediador no mundo árabe diminuído ainda mais quando concordou em participar com Israel do "criminoso embargo a Gaza".
"A credibilidade do Egito foi substituída por Catar e Turquia, países que detém boas relações com Irã, Síria e grupos militantes palestinos e libaneses", enfatizou o jornal.
O diário libanês An Nahar qualificou a abertura da fronteira com Gaza como uma derrota egípcia por vir neste momento.
De acordo com o jornal, há muito tempo que alguns governos árabes, a Turquia e grupos humanitários vinham pedindo ao Egito que abrisse a fronteira com Gaza, sob o argumento de que o bloqueio em si era um crime contra a população palestina e sem resultados práticos em minar o poder do Hamas.
"Infelizmente, foi preciso que morressem ativistas internacionais e uma pressão da comunidade internacional para que o Egito usasse o bom senso e retirasse o bloqueio a Gaza".
Clique Entenda o embargo à Faixa de Gaza
'Acuado'
O cientista político Fares Ishtay, da Universidade Libanesa, acredita que a posição do Egito se enfraqueceu por decisões equivocadas, especialmente durante a operação israelense contra Gaza, no final de 2008 e início de 2009.
"Os egípcios decidiram fechar sua fronteira com Gaza, atendendo a um pedido de Israel, não permitindo a fuga de refugiados. Os árabes nas ruas jamais esqueceram isso."
Para Ishtay, o Egito se sente acuado e sem credibilidade em um momento em que a Turquia e seu primeiro-ministro, Recep Tayyip Erdogan, se transformaram em heróis nas ruas árabes.
"Líderes turcos têm mais credibilidade hoje que muitos governantes árabes e palestinos", completou.
Em diversas capitais árabes, muitas bandeiras turcas eram exibidas por manifestantes que protestavam contra Israel e o ataque às embarcações humanitárias.
Analistas
De acordo com Oussama Safa, diretor do Centro Libanês para Estudos Políticos, a abertura da fronteira com Gaza, apesar de aliviar a tensão na região momentaneamente, não é uma solução duradoura.
"No que se refere a Gaza, não é apenas o bloqueio o tema central. O que se deve resolver é a relação Egito, Hamas e Israel, ou seja, três atores com relacionamentos complicados ente si", salientou Safa.
Para o professor, o Egito precisa fazer escolhas pontuais enquanto ainda pode.
"O governo egípcio precisa refletir se quer continuar a ser uma voz forte dentro do mundo árabe. E ignorar o Hamas enquanto compactua com Israel é a pior mensagem que pode passar às massas árabes".
"Neste ponto, a Turquia foi muito mais bem sucedida. Ela fez diplomacia com todos os grupos sem, necessariamente, compactuar com o Hamas", completou.
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