Por Bernardo Joffily
Lucia Hippolito admite que Temer será o vice de Dilma. Mas escamoteia que isso só acontecerá porque os "muitos PMDBs", como ela diz, assim deliberarão. E garimpa os seus exemplos para fazer os ouvintes menos avisados da CBN acharem que a minoria é maioria.
Três maus exemplos duramente garimpados
"Em Pernambuco, o senador Jarbas Vasconcelos vai ser candidato ao governo. E nós sabemos que vai abrir o palanque para Serra", comemora a funcionária dos Marinho.
Jarbas de fato se lançou, nesta quinta-feira (6), depois de muita hesitação, como única alternativa para garantir a Serra uma cabeça-de-ponte no sétimo maior colégio eleitoral brasileiro (no Rio de Janeiro, segundo maior colégio, o presidenciável tucano continua sem palanque). Não é novidade. Jarbas é, há duas décadas, talvez o mais tucanófilo dos peemedebistas. Contei essa história no ano passado (veja Jarbas na Veja: crepúsculo de um vira-casaca).
A novidade pernambucana é que Jarbas anunciou a candidatura sem conseguir a condição que colocara para se lançar: que o senador Sérgio Guerra, presidente nacional do PSDB, entrasse na chapa majoritária como candidato à reeleição. No mesmo dia em que o peemedebista se lançava, Guerra amarelou oficialmente: confirmou para a imprensa que desistiu do Senado e vai disputar uma vaga na Câmara.
A segunda novidade é que nesta eleição todas as pesquisas eleitorais em Pernambuco, com ou sem Jarbas, apontam a reeleição do governador Eduardo Campos, do PSB. O Leão do Norte é o estado onde Lula alcança os maiores índices de popularidade e apoio.
O segundo exemplo de Lucia Pippolito já é uma suposição: no Rio Grande do Sul, diz ela, o peemedebista José Fogaça "também parece que vai apoiar José Serra".
"Parece"? O pré-candidato tucano esteve nesta semana no Rio Grande do Sul. Tentou marcar uma reunião com Fogaça, mas só conseguiu um encontro no aeroporto que o prefeito de Porto Alegre garante ter sido casual. Marcou também uma reunião com os deputados estaduais peemedebistas, mas compareceram dois, dos quais um (Alberto Oliveira) não disputará esta eleição.
O PMDB gaúcho tem toda uma tradição de enfrentamentos com o PT (o próximo será em outubro, com o ex-ministro Tarso Genro, que aparece em primeiro nas pesquisas). Mas em 2010 está bebendo água de canudinho, sem se comprometer, de olho nas pesquisas e na correlação de forças dentro do partido.
Já o terceiro exemplo obrigou Lucia Hippolito a começar com um "curiosamente": "Curiosamente, em São Paulo, o MDB, que era Orestes Quércia, hoje Orestes Quércia volta a se reunir com José Serra e vai apoiar".
É, de fato, curiosíssimo ouvir Lucia Hippolito na CBN enaltecendo Orestes Quércia. Mais curioso só mesmo Quércia e Serra de braços dados, esquecidos das divergências que estão no DNA tucano.
Prazo de validade: 36 dias
Porém a intrépida jornalista não teme brigar com a notícia e conclui: "Aquele PMDB Ulyssista está com Serra. O PMDB histórico, aquele ligado ao doutor Ulysses (Guimarães que presidiu o MDB-PMDB entre 1970 e 1992), eles estão se reunindo em torno de José Serra".
"Temer não fala pelo partido todo, fala por uma parte pequena do partido, que é o PMDB congressual, aquele que fica reunido lá em Brasília. O PMDB dos estados é outra realidade. E o deputado Michel Temer não fala por eles", assevera Lucia Hippolito.
O doutor Ulysses não pode se pronunciar. Morreu há 18 anos, num acidente de helicóptero em Angra dos Reis, e sequer seu corpo foi achado – sepultado nas águas do mar que fizera a fama de seu xará grego. Mas sua maior obra, o PMDB, falará por ele em 12 de junho – quando o "PMDB dos estados" se reunirá nacionalmente e se encerrará o prazo de validade da cascata de Lucia Hippolito.
Um exemplo político clássico
O itinerário recente do grande partido de centro merece a atenção de quem deseje entender o conteúdo da luta política no Brasil. Em 2002, apoiou os tucanos e forneceu a vice de José Serra na disputa presidencial, Rita Camata (ES); em 2006 ficou em cima do muro. E agora vai de Dilma Rousseff, no campo de Lula. Comentei recentemente essa trajetória (veja em 2002, 2006, 2010: a correlação de forças presidencial mudou).
É um exemplo clássico: desde a Revolução Francesa, quando surgiram as noções de esquerda, direita e centro, este último é alvo da acirrada disputa das duas primeiras. Ambas buscam atraí-lo ou pelo menos neutralizá-lo para isolar sua antípoda.
Sob este ângulo, o ex-governador José Serra, em suas muitas noites insones, deve sentir saudades de 2002, quando tinha o PMDB em sua chapa. É verdade que isso não impediu sua derrota. Mas será duro ver o maior partido do país, com seu precioso tempo no horário eleitoral de TV, mais unificado do que nunca desde o fim da ditadura militar, em torno da continuidade do projeto de Lula.
Em 12 de junho, aposto, Lucia Hippolito não se dará por achada. Nem irá à CBN dizer que estava errada quando assegurou que Temer "fala por uma pequena parte do partido". Terá outra tese ardorosa para servir ao seu candidato, até que o próximo prazo de validade se esgote
Fonte: Vermelho
Nenhum comentário:
Postar um comentário