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sábado, 29 de janeiro de 2011

A temida voz dos árabes

Os ventos revolucionários da Tunísia chegaram ao Egito. Depois da derrubada do regime do tunisiano Zine Al-Abidine Ben Al, que desfrutou de poder quase absoluto por 23 anos, a fúria das chamadas "ruas árabes" se dirige agora contra o líder egípcio. No controle da terra dos faraós há 29 anos, Hosni Mubarak é o alvo da revolta e desejo de mudança da população local. As cenas de caos em vários pontos do país, especialmente no Cairo, sugerem uma nação transformada. De forma espontânea, sem necessariamente ligação com grupo político algum, cidadãos das mais diferentes tendências e ideologias tomaram as ruas para dizer "basta" a um regime autoritário. Mas, ao contrário dos protestos que derrubaram o comunismo na Europa na virada da década de 80 para a de 90, no exterior os movimentos populares árabes geram tanto otimismo quanto preocupação.

O regime de Mubarak é um dos principais aliados dos Estados Unidos no mundo árabe. Recebe de Washington quase US$ 2 bilhões anuais em ajuda econômica e militar, ficando atrás apenas de Israel. Nos últimos anos os Estados Unidos vêm dizendo que essa ajuda precisa ser acompanhada de abertura política e econômica, mas Mubarak nunca sinalizou intenção de mudar as regras do jogo. Pelo contrário: aos 82 anos, o líder egípcio vinha indicando sua intenção de passar o poder para seu filho, Gamal, repetindo o ritual dinástico de nações como Síria ou Jordânia.

Os Estados Unidos nunca condenaram abertamente o modelo político do Egito nem os planos de Mubarak para o país, e o presidente Barack Obama tem sido cauteloso ao defender o direito da população de se manifestar. Obama e seus antecessores nunca esqueceram as circunstâncias em que Mubarak chegou ao poder, em 1981. Ele ocupava a vice-Presidência quando o presidente, Anwar Sadat, que dois anos antes havia assinado o histórico e polêmico acordo de paz com Israel, foi assassinado. Fundamentalistas usaram granadas e metralhadoras contra o presidente e convidados durante uma parada militar. Outras 11 pessoas morreram, e o próprio Mubarak foi ferido. Já na Presidência, Mubarak enfrentou um resurgimento das ações de fundamentalistas, especialmente nos anos 90, quando um grande atentado em Luxor deixou mais de 50 turistas estrangeiros mortos. A resposta de Mubarak foi um regime cada vez mais fechado, sem direito a dissidências ou manifestações, comandado por truculentas forças de segurança sobre as quais sempre houve a suspeita do uso sistemático da tortura.

A receita sempre foi tolerada por Washington, que teme as consequências para a região da derrubada de regimes autoritários, mas aliados ao Ocidente. Exemplos passados aumentam tal preocupação. Em 1991, as eleições na Argélia foram vencidas no primeiro turno pelo partido islamista, a Frente Islâmica de Salvação, o que levou as autoridades a cancelar a segunda votação. O Exército assumiu o poder, o que levou a uma guerra civil marcada por massacres de civis e um saldo de 200 mil mortos. As eleições palestinas de 2006 resultaram na vitória do Hamas e a consequente divisão política da Palestina, com a Faixa de Gaza nas mãos do grupo religioso e a Cisjordânia sob controle da Autoridade Nacional Palestina. No próprio Iraque, onde uma tentativa de democracia foi imposta militarmente pelos Estados Unidos, a situação interna segue muito mais instável e violenta do que nos tempos de Saddam Hussein.

Com os recentes aumentos de preços dos alimentos, que impôs dificuldades extras a populações já sofrendo com a estagnação econômica, tornou-se ainda mais difícil para regimes autoritários árabes controlarem seus cidadãos. Depois de Tunísia e Egito, protestos foram registrados também no Iêmen. Somada a décadas de frustração e repressão, uma realidade de desemprego e inflação solapa as estruturas do tradicional modelo político local. Estados Unidos, Israel e líderes de outras autocracias locais acompanham os acontecimentos no Cairo com apreensão. Mas sabem que barrar os ventos de mudança é missão quase impossível, e a única opção parece ser ajustar a direção para a qual eles sopram. Isso se não estivermos diante de um verdadeiro furacão.
Mubarak dissolve governo e defende repressão aos protestos
Tariq Saleh
Enviado especial da BBC Brasil ao Cairo





Em seu primeiro pronunciamento desde o início da onda de manifestações no Egito, o presidente do país, Hosni Mubarak, anunciou nesta sexta-feira a dissolução do governo e afirmou que um novo gabinete seria nomeado no sábado

Em discurso transmitido pela TV estatal, Mubarak, que que está no poder desde 1981, disse ainda que os protestos não estariam ocorrendo caso seu governo não tivesse introduzido liberdades civis e de imprensa no país.


Ele defendeu a atuação das forças de segurança na repressão das manifestações e afirmou que não permitiria que o Egito, país tão importante para o norte da África e o Oriente Médio, seja desestabilizado.
A fala de Mubarak ocorreu enquanto milhares de manifestantes desafiavam um toque de recolher imposto no país nesta sexta-feira, apesar da presença de militares nas ruas.
Inicialmente aplicado em três cidades (Cairo, Suez e Alexandria), a medida foi estendida a todo o território egípcio no início da noite (hora local, à tarde no Brasil), refletindo uma intensificação nos protestos durante o dia.

Segundo fontes médicas, ao menos 13 pessoas morreram em Suez e cinco morreram no Cairo em confrontos nesta sexta-feira, o que eleva para 26 o total de mortes ocorridas desde que os protestos se iniciaram, na terça-feira.

Mais cedo, ainda nesta sexta, serviços de internet e telefonia celular foram aparentemente bloqueados no país.

No Cairo, manifestantes atearam fogo na sede do Partido Nacional Democrático, mesma agremiação de Mubarak, e cercaram os prédios do Ministério das Relações Exteriores e da TV estatal.

A emissora anunciou que o toque de recolher vigoraria entre as 18h desta sexta-feira e as 7h do sábado e que militares trabalhariam em conjunto com os policiais para reforçar a ordem.


Locais onde têm ocorrido os protestos no Egito


Militares
A TV egípcia transmitiu a chegada ao Cairo de tropas militares e de blindados. Ao passar pelos manifestantes, muitos soldados acenavam para a multidão.

As manifestações desta sexta-feira - de proporção sem precedentes na história do Egito - se seguem a três dias de protestos e foram inspiradas em uma onda de protestos populares que culminou com a queda do presidente da Tunísia, Zine Al-Abidine Ben Ali, há duas semanas.

Também nesta sexta, policiais tunisianos evacuaram um acampamento de manifestantes diante do escritório do primeiro-ministro Mohamed Ghannouchi, em Túnis. Eles exigiam a renúncia do governo interino e a saída de todos os aliados de Ben Ali.

O premiê voltou a pedir calma aos manifestantes e disse que seu governo continuaria no poder até a instauração da democracia no país.

No Cairo, policiais entraram em confronto com milhares de manifestantes nas ruas, usando bombas de gás lacrimogêneo e canhões d'água para dispersar a multidão, que respondeu atirando pedras, queimando pneus e montando barricadas.

A BBC Brasil acompanhou alguns embates e viu policiais à paisana baterem em mulheres que caminhavam perto da multidão.

Conforme a noite avançava, helicópteros sobrevoavam a capital e tiros eram ouvidos.

No Cairo, policiais entraram em confronto com manifestantes
Ao menos mil pessoas foram presas nos protestos


Estados Unidos
Nesta sexta-feira, a secretária de Estado americana, Hillary Clinton, exortou as autoridades egípcias a permitir protestos pacíficos. "Estamos profundamente preocupados com o uso da violência pela polícia e força de seguranças egípcias contra manifestantes", disse Hillary.

O porta-voz da Casa Branca, Robert Gibbs, disse que os Estados Unidos poderão revisar sua ajuda ao Egito com base no desenrolar dos eventos nos próximos dias.

"Obviamente nós vamos revisar nossa postura de assistência baseados nos eventos agora e nos próximos dias", afirmou Gibbs.

O Egito é o quarto principal destinatário de ajuda americana, atrás apenas do Afeganistão, do Paquistão e de Israel.

Nesta sexta-feira, o governo americano lançou um alerta para seus cidadãos, desaconselhando qualquer viagem não-essencial ao Egito.

Outras cidades
Em Suez, um grupo invadiu uma delegacia de polícia, roubou armas e ateou fogo ao prédio. Choques também foram registrados nas cidades de Alexandria, Mansoura e Assuã, assim como Minya, Assiut, Al-Arish e na Península do Sinai.

Há relatos de que centenas de líderes da oposição foram presos durante a madrugada. Ao menos dez pertenceriam à organização Irmandade Islâmica, banida pelo governo.

Outros relatos dão conta de que o líder da oposição e Nobel da Paz Mohamed ElBaradei estaria sendo mantido em prisão domiciliar, mas a versão não foi confirmada oficialmente.

ElBaradei, ex-diretor da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), chegou ao Cairo na quinta-feira para se juntar às manifestações.


Fonte: Blog do Editor

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