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terça-feira, 29 de junho de 2010

Um ano após queda de Zelaya, crise política ainda perturba Honduras

Um ano depois da deposição do presidente de Honduras, Manuel Zelaya, o governo do país liderado por Porfírio Lobo ainda luta para conquistar legitimidade e solucionar a crise política interna que se arrasta desde 28 de junho do ano passado.

Lobo, eleito em novembro com a promessa de resolver o impasse, é alvo de críticas de grupos de defesa dos direitos humanos e enfrenta a pressão da oposição, que defende a convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte.

Pouco antes de viajar à Africa do Sul para acompanhar a Copa do Mundo, Porfírio Lobo disse ter conhecimento de uma conspiração para retirá-lo do poder, assim como ocorreu com seu antecessor.

"Sabemos muito bem quem são eles e tenho todas as informações. Querem pegar o presidente da República", disse o líder hondurenho.

No âmbito internacional, o Brasil e os países da Unasul (União das Nações Sul-Americanas) - com exceção de Colômbia e Peru - resistem em aceitar a reincorporação de Honduras à Organização dos Estados Americanos (OEA), de onde o país foi expulso após a queda de Zelaya.


O grupo exige, como precondição para que Honduras volte à ser membro da OEA, o fim do exílio de Zelaya e sua reincorporação à política, com garantias de que não haverá perseguição quando o ex-presidente retornar ao país.

Líderes sul-americanos também questionam a anistia concedida por Porfírio Lobo à cúpula militar, antes da conclusão dos trabalhos da chamada Comissão da Verdade, instalada há apenas um mês, para apurar as responsabilidades sobre os crimes ocorridos durante o governo de fato.

Um diplomata brasileiro disse à BBC Brasil que a maioria dos países da região não vê o "processo eleitoral viciado" que deu origem ao governo de Lobo como "uma solução para Honduras".

"O que preocupa é o precedente que este golpe de Estado marca na região. O problema é de princípios. Antes de reincorporar Honduras à OEA, temos que garantir que esses problemas de fundo serão resolvidos", afirmou.

Cerco militar

Zelaya deixou a embaixada do Brasil em Tegucigalpa, onde foi acolhido durante quatro meses como "hóspede", em janeiro de 2010.


A embaixada brasileira foi alvo de um cerco militar enquanto Zelaya esteve ali. Comida, eletricidade e água chegaram a ser cortados como medida de pressão para que o governo brasileiro entregasse o ex-presidente às autoridades.


O impasse só foi resolvido quando Porfírio Lobo assumiu o governo e concedeu um salvo-conduto para que Zelaya pudesse deixar o país.


A embaixada do Brasil em Tegucigalpa continua sem embaixador. No seu lugar, está o conselheiro Antônio Carlos Sales Menezes, encarregado de negócios.


Desde então, o ex-presidente hondurenho está exilado na República Dominicana, de onde reivindica o direito de obter um retorno "incondicional" a Honduras. Os opositores de Zelaya querem levá-lo à Justiça pela acusação de violação da Constituição.


Críticos afirmam que, apesar de Porfírio Lobo ter declarado que poderia ir "pessoalmente" buscar Zelaya de volta a Honduras, a presença de funcionários vinculados ao governo de fato no Ministério Público e na Suprema Corte de Justiça impediria um julgamento "imparcial" do ex-presidente.


"Apesar da boa vontade de Pepe Lobo, não há mínimas condições para que Manuel Zelaya volte a Honduras enquanto não houver mudanças no interior dessas instituições", afirma Andrés Pavón, presidente do Comitê para a Defesa dos Direitos Humanos (CODEH), à BBC Brasil.


Reconhecimento
O governo de Honduras conta com o reconhecimento dos Estados Unidos (seu principal aliado), da União Europeia, da Colômbia, do Peru e dos países centro-americanos - com exceção da Nicarágua.
A exclusão de Honduras do SICA (Sistema de Integração Centro-Americano) deverá ser o centro dos debates da reunião de cúpula do grupo convocada para terça e quarta-feira no Panamá.


O retorno de Honduras ao grupo só será possível caso haja uma flexibilização da posição nicaraguense, que tende a estar alinhada à posição dos países sul-americanos contrários ao reconhecimento do governo de Porfírio Lobo.


Outro fator que impede a reincorporação de Honduras ao sistema interamericano são as acusações de violações de direitos humanos sob o governo de Pepe Lobo.


Em maio, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) apresentou um relatório em que afirma que "continuam as violações aos direitos humanos no contexto do golpe de Estado".


A CIDH afirma ter conhecimento do assassinato de ativistas de direitos humanos e jornalistas durante o governo de Porfírio Lobo e critica a "impunidade" com que as mortes teriam sido tratadas.


De acordo com a organização não-governamental de direitos humanos CODES, durante os cinco meses de governo de Lobo, nove jornalistas foram assassinados, além de sete ativistas vinculados à opositora Frente Nacional de Resistência Popular (FNRP). Outros 700 casos de violação de direitos humanos foram denunciados também no período.


"Vemos o ressurgimento de grupos paramilitares, financiados por alguns setores empresariais, que perseguem e cometem crimes com o objetivo de amedrontar e coibir a oposição", afirma Pavón.


Constituinte
A Frente Nacional de Resistência Popular (FNRP) convocou uma série de protestos nesta segunda-feira para marcar o aniversário da deposição de Zelaya. Os protestos incluem bloqueio de rodovias e passeatas na capital Tegucigalpa e em San Pedro Sula.


Paralelamente, o grupo pretende coletar mais de 1 milhão de assinaturas para legitimar a convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte.


Para Berta Cacéres, da direção da FNRP, a crise política e social no país só poderá ser resolvida a partir da realização de um processo constituinte "popular e democrático".


"Continuamos lutando e acreditando que o processo constituinte é o caminho para a refundação de Honduras", afirma Cacéres.


Zelaya foi levado à força de sua casa na madrugada do domingo, 28 de junho de 2009, por militares, quando seria realizada uma consulta popular que poderia ou não promover mudanças na Constituição. O governo de fato argumentava que Zelaya pretendia modificar a Carta Magna para ser reeleito.





Claudia Jardim
De Caracas para a BBC Brasil

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