Rodrigo Capote/Folha
Convertido em estrela da propaganda de Dilma Rousseff, contra José Serra, Paulo Vieira de Souza tomou uma decisão controversa quando era diretor da Dersa.

Mal assumira a diretoria de Engenharia da estatal que cuida das obras viárias de São Paulo, o personagem levou o jamegão a uma alteração contratual.
Paulo Preto, como é conhecido, autorizou as empreiteiras do Rodoanel, menina dos olhos do então governador José Serra, a modificarem o projeto da obra.
Quem conta é o repórter Alencar Izidoro, na Folha. Deu-se o seguinte:

1. Ligado ao senador eleito Aloysio Nunes (PSDB-SP), na época chefe da Casa Civil de Serra, Paulo Preto virou diretor de Engenharia da Dersa em 24 de maio de 2007.
2. No dia seguinte, assinou, junto com o então presidente da Dersa, Thomaz de Aguino Neto, o documento que levou à alteração dos contratos do Rodoanel.
3. Antes da mudança, vigoravam as regras fixadas na gestão do tucano Geraldo Alckmin, antecessor de Serra no governo paulista.
4. Por essas regras, as faturas das empreiteiras eram calculadas pelo serviço executado, pela quantidade e qualidade do material usado na obra.
5. Com a alteração contratual, as empresas passaram a receber um “preço fechado”: R$ 2,5 bilhões. Na prática, foram autorizadas a usar materiais mais baratos.
6. Em troca, as empreiteiras comprometeram-se a apressar a obra. Serra queria entregar o “trecho sul” até abril de 2010, quando iria à campanha presidencial.
7. Dois anos depois, o Ministério Público Federal concluiria que a mexida contratual tornara impossível saber se os pagamentos correspondiam ao executado.
8. Como há verbas federais no empreendimento, o TCU decidiu auditá-lo. E farejou "alterações significativas".
9. Entre as mudanças, anota o relatório do TCU, a "adoção de alternativas de menor custo em relação ao originalmente licitado".
10. Mencionou-se, por exemplo, a troca de concreto moldado no local da obra por pré-moldado, "muito mais barato".
11. Para a Dersa, a diferença foi apenas estética. A estatal alegou, de resto que a alteração do contrato proporcionou uma economia de R$ 100 milhões ao Estado.
12. Meia verdade. As empreiteiras beliscaram da Dersa, em setembro de 2009, um pagamento extra de R$ 264 milhões. Algo incompatível com o “preço fechado”.
13. As empresas queriam mais: R$ 500 milhões. A Procuradoria interveiopara fixar um limite.
Para evitar que a Dersa fizesse “pagamentos indevidos”, firmou-se, com a intermediação dos procuradores, um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta).
14. Ouvido, Paulo Preto disse que não há irregularidades na obra do Rodoanel. Ao contrário. Alega que a alteração de 2007 foi vantajosa para o Estado.
15. A posição do ex-diretor é corroborada pela Dersa. Paulo Preto e a estatal afirmam que agiram inspirados em decreto assinado por Serra em janeiro de 2007.
16. Nesse decreto, editado no primeiro mês de sua gestão, Serra determinou que fossem reavaliados os contratos em vigor.
17. E quanto ao pagamento extra de R$ 264 milhões? Paulo Preto e a Dersa sustentam que houve "fatos supervenientes". Quais? Serviços novos.
18. Responsável por um pedaço da obra, o consórcio Camargo Corrêa/Serveng alega que, considerando-se o porte da obra, os aditivos de preço foram regulares.
19. O consórcio Arcosul, da Odebrecht, diz que as dúvidas levantadas pelo TCU foram todas esclarecidas. Outros consórcios abstiveram-se de comentar.
20. Afastado da Dersa em abril, dias depois de Serra ter mergulhado na disputa presidencial, Paulo Preto virou manchete em agosto.
21. Foi às páginas de IstoÉ em posição constrangedora. Informou-se deu sumiço em R$ 4 milhões de um suposto caixa dois da campanha de Serra.
22. Paulo Preto nega o malfeito. Ajuizou uma queixa-crime contra a revista e os tucanos que foram citados como fonte.
23. Emparedada pelo Erenicegate, Dilma Rousseff enxergou em Paulo Preto uma oportunidade de campanha. Usa-o para arrastar Serra à arena dos malfeitos.
24. A exemplo do ex-auxiliar, Serra nega que Paulo Preto tenha sumido com um pedaço das arcas de sua campanha.
25. Dilma não se dá por achada. Gruda em Paulo Preto a Operação Castelo de Areia, na qual o ex-diretor da Dersa figuraria como beneficiário de propinas da Camargo Corrêa.
26. Paulo Preto responde que não foi indiciado pela PF. Os processos da Castelo de Areia foram sustados por uma liminar do STJ.
27. Alvejado por Dilma, Paulo Preto pediu ao TSE que lhe concedesse direito de Resposta. O tribunal negou.
Alegou-se que, não sendo candidato, o engenheiro não pode freqüentar o horário eleitoral. Deve buscar reparação em outra instância do Judiciário, não na eleitoral.
Paulo Preto levava R$ 11,2 mil na roupa ao ser preso
Reprodução/Revista Época


Trecho do Boletim de Ocorrência lavrado por acasião da prisão de Paulo Preto
Paulo Viera de Souza, o Paulo Preto, é um engenheiro de hábitos faustosos. Em junho, cometeu uma extravagância que lhe rendeu quase 48 horas de cadeia.
O documento acima (Boletim de Ocorrência número 3.264/2010) contém os detalhes da desventura do ex-diretor da Dersa, a estatal rodoviária de São Paulo.
Deve-se ao repórter Walter Nunes, de ‘Época’, a exposição da cópia. Obteve-a no 15º Distrito Policial de São Paulo.
Foi numa cela desse distrito que se hospedou Paulo Preto, a contragosto, entre a noite do dia 12 e a tarde do dia 14 de junho.
Ao ser detido, Paulo Preto levava consigo R$ 11.242. Dinheiro vivo. Abaixo, um resumo do que sucedeu:

1. No dia 12 de junho, Paulo Preto foi ao meio-fio decidido a adquirir uma joia. Um presente para a mulher, pela passagem do Dia dos Namorados.
2. Dirigindo seu automóvel, uma BMW Z4 preta (coisa de R$ 130 mil), Paulo Preto foi à presença do comerciante Musab Asmi Fatayer.
3. Encantou-se por um bracelete salpicado de brilhantes. Dispôs-se a pagar R$ 20 mil pelo mimo. Antes, exigiu a avaliação de um especialista.
4. Junto com Musab, o mercador de joias, Paulo Preto foi ao Shopping Iguatemi, um dos endereços mais chiques da capital paulista.
5. A dupla se dirigiu a uma loja da joalheria Gucci. Exibiram o bracelete, para que fosse aferida a autentidade dos brilhantes e estimado o preço.
6. Súbito, deu-se o inesperado. Os funcionários da joalheria constataram que a joia pertencia à Gucci. Fora furtada da loja no mês anterior.
7. Acionada, a polícia deu voz de prisão ao ex-diretor da Dersa e ao comerciante. Prisão em flagrante.
8. No instante em que foi em cana, Paulo Preto carregava R$ 11.242. Nos bolsos do casaco, R$ R$ 8.500. Nos da calça, R$ 2.742. Musad portava R$ 1.614.
9. Levados à presença da delegada Nilze Baptista Scapulatiello, os presos foram inquiridos.
10. Conta o boletim de Ocorrência que Paulo Preto disse que “estava comprando o tal objeto [o bracelete] da pessoa de Musab por R$ 20 mil”.
11. Musab disse à delegada que comprara a joia. De quem? “De um desconhecido”. Desembolsara, segundo sua versão, “R$ 18 mil”.
12. Como desgraça é coisa que não chega só, chegou à delegacia, no instante em que Paulo Preto arrostava seu infortúnio, o deputado Celso Russomano (PP-SP).
13. Rival do tucanato e aliado da antagonista de José Serra, Dilma Rousseff, o deputado fora à DP para registrar um boletim de ocorrência.
14. Russomano desentendera-se com o segurança de um edifício, que tentara impedi-lo de estacionar o carro nas proximidades da garangem do prédio.
15. O aliado de Dilma pinta a cena que testemunhou com cores vivas: “Quando eu cheguei à delegacia, Paulo Preto tinha acabado de ser preso...”
“...A delegada estava sofrendo a maior pressão. Estava todo mundo ligando para ela: delegado, delegado seccional, delegado regional...”
“...O diretor do Decap [Departamento de Polícia Judiciária da Capital], delegado-geral de polícia, desembargador, todo mundo pedindo para soltar o cara”.
16. O deputado diz ter decidido fazer, ele próprio, pressão sobre a delegada. No seu caso, pressão para que Paulo Preto permanecesse no xilindró.
“Eu falei para ela: a senhora não pode fazer isso. Vai responder por crime de prevaricação. A senhora vai explicar o quê para os clientes?...”
“...Que ele está de boa-fé? Como ele está de boa-fé comprando uma joia furtada com dinheiro na meia, no casaco, na camisa?”
17. Nesse ponto, o relato de Russomano extrapola o boletim de ocorrência, que não fala em “dinheiro na meia” e “na camisa”.
18. Advogado de Paulo Preto, José Luiz de Oliveira Lima desdiz Russomano: “Não teve pressão nenhuma. Como advogado, argumentei com a delegada”.
Telefonema, diz o doutor, só de um desembargador, “primo do Paulo”, interessado em “saber o que estava acontecendo”. De resto, nada de numerário na meia.
19. Uma curiosidade: José Luiz, o advogado de Paulo Preto, é também defensor do grão-petista José Dirceu no processo do mensalão, que corre no STF.
20. Após usufurir das facilidades do 15º DP por um final de semana, Paulo Preto e Musab foram soltos na tarde do dia 14, uma segunda-feira. Liberou-os um juiz.
21. Em 13 de outubro, ao julgar habeas corpus ajuizado pelo doutor José Luiz, o desembargador Francisco Menin, do TJ-SP, suspendeu a ação por receptação de jóia roubada.
A eventual reabertura do caso depende agora da análise de recurso em que Paulo Preto pede a extinção do processo.
Fonte: Josias de Souza
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